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O enunciado procura retratar o entendimento contido na deliberação da qual foi extraído, não constituindo, todavia, um resumo oficial da decisão proferida pelo Tribunal. Tampouco objetiva representar o posicionamento prevalecente no TCU sobre a matéria.
Conteúdo do documento
Área
Direito Processual
Tema
Princípio da ampla defesa
Subtema
Controle objetivo
Outros indexadores
Determinação, Ato ilegal, Anulação, Súmula vinculante
Tipo do processo
APOSENTADORIA
Enunciado
Nos processos em que o TCU determina a órgão jurisdicionado a adoção de providências para o exato cumprimento de lei (art. 71, inciso IX, da Constituição Federal), sem ele próprio anular o ato questionado, a relação se estabelece entre o Tribunal e o órgão, e não entre servidores do órgão e o Tribunal, não se aplicando, portanto, a Súmula Vinculante 3 do STF. Nesses casos, o exercício do contraditório e da ampla defesa deve ser exercido pelo servidor no próprio órgão.
Excerto
Relatório:
Cuidam os autos de pedidos de reexame interpostos por [interessado] contra o Acórdão 1753/2018-TCU-Primeira Câmara.
[...]
4.Instruído o presente feito, faço reproduzir, com os ajustes que julgo pertinentes, o exame técnico e o encaminhamento oferecidos pela Secretaria de Recursos deste Tribunal (peça 55), que contou com a anuência do corpo diretivo daquela unidade (peças 56 e 57):
"HISTÓRICO
2.Nos termos do Acórdão 303/2015-TCU-Plenário, este Tribunal reconheceu a existência de irregularidade na reintegração de empregados oriundos da Portobrás e da EBTU, com base na Lei 8.878/1994. Isso porque a sobredita reintegração foi levada a efeito, pelo Ministério dos Transportes, mediante a transposição do regime de trabalho dos reintegrados, de celetista para estatutário, sem que houvesse comando legal ou judicial que amparasse esse procedimento.
2.1.Assim, diante da constatação de que a aposentadoria do recorrente padecia de impropriedade relativa à transposição indevida para o regime estatutário, seu ato foi julgado ilegal.
[...]
6.Do princípio do contraditório e da ampla defesa
6.1.Defende no recurso que o Acórdão 303/2005-TCU-Plenário feriu o princípio do contraditório e da ampla defesa, aduzindo os seguintes argumentos:
6.2.O TCU, no Acórdão 303/2015-TCU-Plenário confundiu responsáveis com entidades fiscalizadas e não chamou à lide administrativa os recorrentes e seus pares, na condição de terceiros interessados, em desrespeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa.
Análise
6.3.Em síntese, o recorrente se insurge contra o fato de o TCU ter proferido o Acórdão 303/2015-TCU-Plenário sem que lhe fosse oportunizado o contraditório.
6.4.O Acórdão 303/2015-TCU-Plenário, prolatado nos autos do TC Processo 030.981/2011-5, estipulou prazo para que o Ministério dos Transportes e o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão adotassem as providências necessárias ao reestabelecimento do regime celetista para os anistiados da EBTU e da Portobrás (subitem 9.2.1), assegurado o contraditório e a ampla defesa àqueles afetados pela medida. Determinou, também, à Sefip que analisasse todos os atos admissão, concessão de aposentadoria ou pensão pertinentes aos servidores anistiados e verificasse a possível ocorrência de transposição indevida de regimes, como a descrita nestes autos, a fim de propor sua revisão de ofício (item 9.4).
6.5.Com relação a desfazimento de ato administrativo, expõe a Súmula Vinculante n. 3, do STF, que 'nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado'.
6.6.Interpretando extensivamente o conteúdo da súmula, em respeito à sua teleologia, é possível concluir que o contraditório é indispensável quando da decisão puder resultar gravame específico ao destinatário - não só a anulação de ato administrativo, mas também a condenação a pagamento de valores, imposição de sanções de natureza não pecuniária, supressão de vantagens etc.
6.7.Não há a mesma obrigatoriedade, porém, quando o Tribunal apenas determina ao órgão jurisdicionado ou mesmo a uma de suas unidades técnicas a adoção de providências para o cumprimento de seus deveres legais, de suas atribuições institucionais específicas, sem que daí resultem obrigações a que o destinatário já não esteja sujeito por força da própria lei, conforme exposto no precedente transcrito a seguir:
'A Súmula Vinculante n. 3 não se aplica às decisões em que o TCU, no uso de sua competência prevista no art. 71, IX, da CF, apenas determina ao órgão jurisdicionado a adoção de providências para o cumprimento da lei, sem ele próprio anular o ato questionado' (Relatora Ministra ELLEN GRACIE, Reclamação 7000/DF, DJe nº 21, divulgado em 30/1/2009; Relator Ministro CELSO DE MELLO, Reclamação 7096/MC-RJ, DJe nº 22, divulgado em 2/2/2009).
6.8.O entendimento ora exposto encontra, igualmente, respaldo na jurisprudência deste Tribunal, amparado também por decisões do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a relação processual existente em processos em que o TCU atua como órgão fiscalizador, no exercício constitucional do controle externo, ocorre diretamente com o órgão fiscalizado (Acórdãos 2.878/2008, 1.723/2010, 5.082/2010, 1.696/2012, todos do Plenário).
6.9.Assim, nas situações em que o TCU determina ao órgão a adoção de medidas concretas necessárias à fiel observância da lei, o contraditório não é indispensável, porque não há a imposição de deveres que, em última análise, já não estejam inseridos na esfera de responsabilidade dos órgãos destinatários.
6.10.No caso concreto, a decisão em exame limita-se a determinar à Sefip e aos órgãos competentes da Administração que cumpram seus deveres institucionais quanto à verificação dos atos admissão, concessão de aposentadoria ou pensão e ao reestabelecimento do regime celetista para os anistiados, respectivamente.
6.11.Sobre o tema, não se pode relegar ao oblívio o Acórdão 2526/2016-TCU-Plenário, no sentido de que este Tribunal 'exerceu a chamada jurisdição objetiva, ou seja, a relação processual estabeleceu-se apenas entre a Corte de Contas, de um lado, o Ministério dos Transportes, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, de outro, tendo-se limitado o órgão de controle externo, no exercício de sua missão constitucional, a expedir aos órgãos ministeriais comando de natureza mandamental, sem efeito desconstitutivo, dado que determinou às unidades jurisdicionadas a adoção de providências para o exato cumprimento da lei, sem que ele próprio - o Tribunal de Contas da União - anule os atos questionados'.
6.12.Acrescente-se que se está a apreciar a legalidade de ato inicial de aposentadoria, em que, nos termos da Súmula Vinculante 3 do STF, se dispensa o contraditório antes da deliberação deste Tribunal.
6.13.É legítimo o direito de irresignação manifestado pelo recorrente, viabilizado pelo recurso. Não há, porém, razões para se invalidar o Acórdão 303/2015-TCU-Plenário, sob o fundamento arguido de vício processual, pois tal vício inexiste no caso concreto.
[...]"
Voto:
Cuidam os autos de pedido de reexame interposto contra o Acórdão 1753/2018-TCU-Plenário, que, dentre outros itens, considerou ilegal o ato de aposentadoria de [interessado] - servidor anteriormente vinculado à Empresa de Portos do Brasil (Portobrás) que foi anistiado e reintegrado ao serviço público federal por força da Lei 8.878/1994 - em razão de irregularidade na transposição do regime celetista para o regime estatutário quando de sua reintegração.
[...]
3.No mérito, a secretaria especializada propõe o conhecimento e a negativa de provimento ao pedido, ante a ausência de elementos suficientes para alterar a deliberação vergastada, desfecho que contou com o apoio do Parquet de Contas e que igualmente acolho, razão pela qual adoto aqui, como razões de decidir, os fundamentos sustentados nos pareceres precedentes, sem prejuízo das seguintes considerações.
4.Com efeito, a questão relativa à reintegração de servidores anistiados com a alteração do regime de trabalho que eles anteriormente detinham (de celetista para estatutário) foi objeto de ampla análise pelo TCU por ocasião do Acórdão 303/2015-TCU-Plenário, que evidenciou a ilegalidade da referida transposição de regime, realizada sem suporte jurídico e não amparada em sentença judicial.
5.Como se vê, não se discute a legitimidade da reintegração do servidor, mas tão somente a alteração de seu anterior vínculo de trabalho, de natureza celetista, para o regime estatutário. Conforme amplamente delineado no relatório precedente, a Portobrás era uma empresa pública vinculada à administração indireta, de modo que seus servidores não foram abarcados pelo disposto nos arts. 19 e 24 do ADCT e no art. 243 da Lei 8.112/1990, não havendo suporte à reintegração no regime estatutário.
[...]
10.No que se refere à alegação de que o Acórdão 303/2015-TCU-Plenário feriu os princípios da ampla defesa e do contraditório, a secretaria especializada foi precisa ao frisar que, quando o Tribunal apenas determina à unidade jurisdicionada a adoção de providências para o cumprimento de seus deveres legais, de suas atribuições institucionais específicas, sem que daí resultem obrigações a que o destinatário já não esteja sujeito por força da própria lei, não se aplica a regra geral da Súmula Vinculante 3 do STF.
11.Nesse sentido, o seguinte excerto é exemplar:
"A Súmula Vinculante n. 3 não se aplica às decisões em que o TCU, no uso de sua competência prevista no art. 71, IX, da CF, apenas determina ao órgão jurisdicionado a adoção de providências para o cumprimento da lei, sem ele próprio anular o ato questionado" (Relatora Ministra ELLEN GRACIE, Reclamação 7000/DF, DJe nº 21, divulgado em 30/1/2009; Relator Ministro CELSO DE MELLO, Reclamação 7096/MC-RJ, DJe nº 22, divulgado em 2/2/2009).
12.Assim, uma vez que o Acórdão 303/2015-TCU-Plenário fixou diretrizes para o exato cumprimento da lei por parte do Ministério dos Transportes e do então Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, não há que se falar em necessidade de prévio contraditório no âmbito do TCU, razão pela qual não merece prosperar a argumentação do recorrente.
13.Quanto aos demais argumentos trazidos pelo recorrente, todos foram suficientemente enfrentados e afastados no exemplar parecer da secretaria especializada, cujos argumentos já foram por mim integralmente acolhidos neste voto.
14.Nesse cenário, não tendo sido apresentados argumentos capazes de alterar a deliberação vergastada, impõe-se a negativa de provimento do presente pleito.
Acórdão:
9.1. conhecer e negar provimento ao presente pedido de reexame, mantendo-se inalterado o Acórdão 1753/2018-TCU-Primeira Câmara;
Referência legal
- Constituição Federal 1988 Art. 71 Inc. IX Congresso Nacional
- Súmula Vinculante 3 STF
Enunciados relacionados
- Nos processos de fiscalização que podem afetar grande número de interessados e nos quais não se examinam situações individuais, mas situações gerais, o contraditório perante o TCU é estabelecido com o órgão cujos atos se examinam. Cabe a este, destinatário da deliberação do Tribunal, assegurar o contraditório e a ampla defesa aos terceiros reflexamente atingidos pela decisão.
- Nos processos em que o TCU determina a órgão jurisdicionado a adoção de providências para o exato cumprimento de lei (art. 71, inciso IX, da Constituição Federal), sem ele próprio anular o ato questionado, a relação se estabelece entre o Tribunal e o órgão, e não entre servidores do órgão e o Tribunal, não se aplicando, portanto, a Súmula Vinculante 3 do STF. Nesses casos, o exercício do contraditório e da ampla defesa deve ser exercido pelo servidor no próprio órgão.
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- Os processos de fiscalização se desenvolvem exclusivamente entre o TCU e suas unidades jurisdicionadas. A participação de terceiros no feito (exercício do contraditório e da ampla defesa) é imprescindível somente na eventualidade de imputação de responsabilidades ou de potencial lesão a interesses jurídicos desses terceiros.
- Nos processos em que o TCU determina a órgão jurisdicionado a adoção de providências para o exato cumprimento da lei (Art. 71, inciso IX, CF/1988), sem ele próprio anular o ato questionado, a relação se estabelece apenas entre o Tribunal e o órgão, não entre servidores do órgão (ou suas entidades representativas) e o TCU, não se aplicando, portanto, a Súmula Vinculante 3 do STF. Nesses casos, o exercício do contraditório e da ampla defesa deve ser exercitado no próprio órgão, abordando a situação específica de cada caso concreto.
- A Súmula Vinculante 3 do STF não rege processos de controle externo de natureza objetiva que não incidam sobre situações concretas, ou seja, que não atinjam diretamente direitos ou interesses individuais concretos de terceiros. Nesses casos, o estabelecimento do contraditório e da ampla defesa previamente à implementação de medidas determinadas pelo TCU recai exclusivamente sobre o gestor. O não chamamento, pelo TCU, dos servidores que possam ser atingidos por suas decisões tão-somente por via reflexa não fere os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois estes devem ser exercidos no âmbito das unidades fiscalizadas.
- Nos processos de fiscalização que podem afetar grande número de interessados e nos quais se examinam situações gerais, o contraditório, no âmbito do Tribunal, é estabelecido com o órgão cujos atos se examinam.
- Nos processos de fiscalização que podem afetar grande número de interessados e nos quais não se examinam situações individuais, o contraditório é estabelecido com o próprio órgão cujos atos se examinam, e não com o TCU, pois a obrigação de chamar todos os eventuais interessados tornaria inviável o exercício da competência atribuída à Corte de Contas para fiscalizar os atos praticados pelos gestores e assinalar prazo para o cumprimento da lei, nos termos do art. 71, inciso IX, da Constituição Federal.
- Nos processos de fiscalização de pessoal, a relação processual se estabelece entre o TCU e o jurisdicionado, não se cogitando, nesses processos, o ingresso de servidores ou empregados alcançados em abstrato pelas deliberações do Tribunal.
- O servidor que se sinta prejudicado por decisão do TCU que determina ao órgão jurisdicionado a correção de atos ilegais que afetam indistintamente múltiplos beneficiários, em que não se discute ato administrativo que o tenha especificamente por destinatário, não tem direito assegurado ao contraditório diretamente no Tribunal (mediante ingresso no processo como interessado), sendo-lhe, contudo, assegurado o exercício desse direito no âmbito do próprio órgão a que se vincula. O mesmo se aplica às entidades representativas de servidores.
- Não se aplica a Súmula Vinculante 3 do STF nos processo de fiscalização em que não são atingidos diretamente direitos subjetivos dos servidores.
- A Súmula Vinculante nº 3 não se aplica às decisões em que o TCU, no uso de sua competência prevista no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, apenas determina ao órgão jurisdicionado a adoção de providências para o cumprimento da lei, sem ele próprio anular o ato questionado.
- Não se conhece de recurso processual contra comando abstrato e genérico, resultante da chamada jurisdição objetiva, independentemente de interesses específicos e partes atingidas, sendo vinculante somente para a Administração.
- Se a fiscalização não abordou, de forma direta, direitos subjetivos de servidores individualmente identificados, cingindo-se ao exame de atos de gestão praticados pelo órgão fiscalizado, resta caracterizada uma relação processual endo-administrativa entre o TCU e o órgão, não se vislumbrando legitimidade recursal de entidades sindicais, haja vista que essas não possuem competência para defender, assistir ou mesmo representar o órgão fiscalizado.
- No caso de relação processual estritamente endo-administrativa entre o TCU e órgão fiscalizado, em que não se atinja direitos subjetivos de servidores, esses não têm legitimidade recursal, uma vez que, em princípio, não possuem competência para defender, assistir ou mesmo representar o ente público.
- A Súmula Vinculante 3 não se aplica às decisões em que o TCU apenas determine a adoção de providências para o cumprimento da lei. No julgamento de processos de tomada de contas, de prestação de contas ou de fiscalizações a relação se estabelece apenas entre os órgãos públicos envolvidos e não entre o servidor e o TCU.
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- Contra decisão genérica e abstrata, tomada no âmbito da jurisdição objetiva, não deve ser conhecido o recurso interposto por quem apenas se considera ameaçado pelo julgamento, sem que o caso particular tenha sido abordado.
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